A geração que pediu demissão
Outro dia estava reparando nas pessoas ao meu redor, principalmente as que me inspiram e que são da mesma geração. Muitas delas tinham algo em comum que eu me identifiquei imediatamente, todas elas encontraram a felicidade no pedido de demissão.
Teve o amigo que pediu demissão de um cargo super bem posicionado em uma multinacional alemã para ser viajante, outra que resolveu trocar a “segurança” do salário fixo para fazer intercâmbio, teve outra que vendeu seu carro, entregou seu apartamento, arquivou sua carteira de trabalho para ser voluntária em escolas pelo mundo, entre outras diversas histórias que fui ouvindo e compartilhando da mesma felicidade.
Nem todas as pessoas da Geração Y pediram demissão.

Mas foi essa galerinha que começou a revolucionar muita coisa no mundo do viver com propósito. Se você também é dessa geração que nasceu entre 1982 e 1994 provavelmente você vai entender o que eu vou falar.
Há tempos que ser feliz era ter uma família com filhos, um casamento estável, casa limpinha (e própria de preferencia), um emprego bem sucedido e estabilidade financeira. Nesse caso os nossos avós tentaram fazer o seu melhor, porque talvez esse fosse o propósito de felicidade daquela geração.
Naqueles tempos não se tinha a competitividade que se tem hoje no mundo do trabalho, principalmente no universo organizacional, se falava pouco sobre ansiedade (hoje tão bem conhecida), muito menos sobre terapia e a equação perfeita era ter uma família que deu “certo” dentro desses padrões de felicidade, cujo modelo era de comercial de margarina.
E depois dessa geração, nossos avós esperavam que nossos pais fossem reproduzir a mesma receita para felicidade e obviamente eles fizeram alguns ajustes. A geração dos nossos pais ficou conhecida pelos divórcios, relações que precisaram ser reconstruídas, segundo casamento surgindo como forma de mostrar pra sociedade que a infelicidade não vale a pena ser alimentada durante a vida toda e que tudo bem se não der certo, porque não somos perfeitos.
Mas isso tudo gerou um sentimento de frustração para nossos avós que com todo empenho do mundo se dedicaram para que a vida dos filhos (no caso nossos pais) coubessem no modelo de felicidade que ate então tinha funcionado pra eles.
A geração dos nossos pais escolheram a carreira como forma de experimentar a felicidade. Eles trabalharam bastante, abriram seu negocio próprio, suaram a camisa, deram o seu melhor, investiram na compra da casa própria, a sair do aluguel, a dar um futuro melhor para seus filhos.
Para eles a felicidade estava atrelada a segurança financeira, estabilidade nos negócios ou no trabalho (principalmente os que tivessem passado para concurso público). Eles pensaram em aplicações no banco, compraram seu primeiro carro e pensavam em permanecer na mesma empresa pelo tempo que fosse necessário para alcançar sucesso na carreira, a tal sonhada felicidade.
Foi nessa geração que as pessoas continuavam guardando pra si seus desejos, suas vontades e seus sonhos, projetando assim em seus filhos (no caso nós) todas as expectativas que eles até então não conseguiram ao longo da vida. Eles diziam “vai fazer colégio particular porque eu não tive a oportunidade de estudar em escola boa” ou “vai casar na igreja porque filho meu não deixa de casar antes de morar junto”, mas no final das contas essa mãe também não havia casado antes de engravidar e muito menos de morar junto.
E depois disso nossos pais nos criaram, nos proporcionando o melhor (dentro das possibilidades) para que nós acessassémos cursos que hoje nos dessem base para nossa formação e consequentemente a felicidade profissional. Nos ensinaram a trabalhar duro também, a não faltar no trabalho quando se esta indisposto, ou logo depois de fazer uma doação de sangue para ajudar um colega.
Ensinaram que a estabilidade proporciona uma vida tranquila, calma e sem grandes preocupações. Ensinaram também que para ser feliz profissionalmente você vai precisar abrir mão de algumas coisas na sua vida e você precisa estar preparado para isso, porque faz parte.
Fizemos grande parte do que eles projectaram e planejaram para nós, estudamos, nos formamos, entramos em empresas boas, ocupamos cargos interessantes, mas… e agora? O que vinha depois?
Começamos a sentir crises de ansiedade

A experimentar uma tristeza sem sentido, uma falta de propósito, mas afinal o que tinha acontecido com a receita da felicidade, pois ate o momento havíamos seguido conforme orientações e modelos sociais que julgavam dar garantia da felicidade plena.
Mas a felicidade não chegou, as pessoas começaram a pensar que ao invés de serem executivos de empresas elas poderiam ser mais felizes sendo florista, boleiras, ou até mesmo esportista. Descobrimos que o sucesso profissional não traz garantia de felicidade e realização e nem sabemos qual é nosso papel no mundo, qual nossa missão, propósito e muito menos quem somos nós e o que desejamos para nossas vidas.
Começa então um exercício de resgate, todo mundo tenta se resgatar, permite sentir aquilo que lhe traz prazer e o que realmente importa pra si. Começa a se desvencilhar das expectativas dos pais e a construir seu próprio caminho, autêntico e totalmente instintivo.
Continuamos a valorizar a família, mas tudo bem se demorar pra formar a sua. Se desejar casar, esta tudo bem, se por acaso se separar, esta tudo bem, se decidir não ter filhos esta tudo bem também.
Se parar pra pensar, nossos pais ja iniciaram esse ciclo de quebra pra gente e só estamos continuando a fazer quebras de paradigmas e estereótipos de felicidades impostos socialmente. Pensando no âmbito da carreira penso que fizemos uma quebra nesse quesito também, não aceitamos essa imposição, desejamos trabalhar com algo que nos dêem prazer, que nos traga preenchimento, sensação de missão cumprida e coração leve.
Qual o seu modelo de felicidade? Qual sua fórmula para ser feliz?
Deixamos de acreditar que a felicidade esta na conta bancária cheia, de que pagar perua escolar para os filhos é melhor do que busca-lo na escola de bicicleta, ou que a casa alugada não tem tanto significado quanto a casa própria.
Precisamos aceitar que somos uma geração “viva la vida” ou “carpe diem”, uma geração que deixa o conforto do lar para viver em outro pais, para viver experiências mais simplistas, mas conectadas com a natureza, mais conectadas com sua essência.
Dizem até que a nossa geração foi aquela que rasgou o diploma e que resolveu começar tudo de novo, e eu acho isso incrível quando vejo uma história dessas, porque é preciso coragem para ir contra tudo aquilo que nos foi ensinado desde o começo da nossa vida.
Coragem essa que muitas pessoas guardam a sete chaves em uma caixa empoeirada guardada la no fundo do armário, porque sabe que se ela sair dali, pode ser que coisas extraordinárias aconteçam e é exatamente disso que muitas pessoas têm medo.
Será que viver feliz é jogar ao vento sua saúde física, mental, sua vida, seu tempo, sua disponibilidade emocional, seus sonhos, seus propósitos, sua liberdade de escolha e tudo aquilo que faz você ser você dentro de um padrão que ja não te cabe mais?