Humilhação não é entretenimento: precisamos falar sobre Lucas e Karol Conká

“Quem me conhece sabe” o tanto que eu sou fã de BBB. Aliás, minto: de reality shows no geral. Antes docês começarem a cochilar durante os discursos do Bial, e testemunharem a passagem de faixa de Brito Junior para Marcos Mion em A Fazenda, eu estava lá, “shippando” Kleber Bambam e Maria Eugênia, e acordando 6 da manhã para assistir Survivor.
Sendo assim, cê pode apostar todas as suas fichas que tenho pós-doutorado para falar sobre esse assunto. Procês terem ideia, até Acorrentados (do Luciano Hulk, bicha, socorro) eu assisti. Enfim… o passado me condena.
“Mas Luísa, por que cê tá dando uma carteirada dessas?”.
Porque em 20 anos de experiência nesse assunto (vergonhosa, mas real), te digo um negócio: “humilhação/abuso psicológico não é entretenimento” é uma bandeira que demorou, e muito, pra ser levantada no universo dos reality shows. Isso porque essas duas palavrinhas, meus amores, ainda mais no universo da televisão aberta, SEMPRE estiveram muito presentes.
Antes de prosseguirmos com essa linha de raciocínio, deixa eu te dar uma contextualizada sobre o que rolou no BBB21 nesses últimos dias (vide confusão entre Karol Conká e Lucas penteado)?
O “protagonismo” de Lucas Koka Penteado
Lucas Penteado, sagitariano com ascendente em gêmeos (menina, isso explica muita coisa), é um ator de 24 anos que nasceu em São Paulo. O moço, antes mesmo de ser conhecido pelo papel de Fio, em Malhação, já tinha um espaço de respeito no universo do poetry slam (batalhas de poesia).
Ativista de carteirinha, suas rimas diziam muito sobre racismo, desigualdade social, vivências de rua e por aí vai. Aí vai uma palhinha:
Beleza, então. Temos aí um pouco da história de Lucas Koka. Podemos falar de BBB agora.
Na sexta passada, dia 29/01, ele pisou na bola FEIO durante a festa temática do Líder. É tanta coisa que esse moço fez que fica até confuso. No final, ninguém da casa entende nada direito, e nem ele. A única pessoa que chegou mais perto de uma interpretação coesa do que ele aprontou foi a Camilla de Lucas, influencer maravilhosa por sinal.
Procê ficar sabendo de tudo mesmo (e com vídeos), tem uma thread maravilhosa no twitter sobre o assunto. Então, antes de continuarmos esse bate-papo, recomendo que você veja ela:
🚨 THREAD DA CONFUSÃO DE HOJE ENVOLVENDO O LUCAS:
— Tracklist (@PortalTracklist) January 30, 2021
Ele se desentendeu com: Kerline, Camilla de Lucas, Arcrebiano, Arthur, Lumena, Carla, Viih Tube, Caio, Sarah etc #BBB21
A festa foi pesada 👇🏼
Então beleza, feshow. Procê que achou que o bicho pegou só no dia dessa festa, só digo uma coisa: que dó. É agora, inclusive, que precisamos falar sobre Karol Conká.
Pode entrar, Karol Conká, a.k.a “rainha do tombamento”…
Karol Conká dispensa apresentações. Rapper, negra, empoderada, feminista (mais tarde quero falar sobre isso em outro texto). Tem 35 anos, nasceu em Curitiba e é capricorniana com ascendente em Áries (jesus amado, isso também explica muita coisa).
Essa moça já deve ter tombado muita gente por aí, e Lucas não foi exceção. Acontece que, de sábado para cá, Karol foi possuída pelo ritmo ragatanga (só que do mal, porque essa música, na real, é tudo de bom) e começou a descer a lenha no menino.
Só que assim… descer a lenha é pouco. Aliás, para quem não entende essa expressão (peço desculpas de antemão), ela exagerou na dose, desceu o cacete, meteu o louco, pirou na batatinha, fuzilou e infernizou não só o Lucas, mas a casa inteira.
Ela já tentou excluir o moço de todas as formas, acuá-lo a todo momento e admitiu, verbalmente inclusive, sem entrelinhas nem duplos sentidos, que “faria esse menino ficar tantã”.
Saca só alguns exemplos do que ela já “aprontou” nesses últimos dias:
Atitude causa revolta nas redes; Teresa Cristina disse "que tombo essa mulher vai tomar quando sair" https://t.co/CR4Pod75zc
— Revista Fórum (@revistaforum) February 2, 2021
“eu ja fui cancelada, eu nunca fui uma canceladora” disse Karol conka após EXCLUIR lucas, ofender o cara em DIVERSAS vezes, falar um monte de merda pra ele e dps soltar um “RESPEITA A MAMACITA”. Isso ta doentio,não é entretenimento. #KarolConkaExpulsa #BoninhoExpulsaKarol pic.twitter.com/II1hIc9qAY
— Larinha✨🥀 (@Larazordenoniii) February 2, 2021
Abuso psicológico não é entretenimento?
Aê! É agora que tia Lu problematizadora entra. Vejo essas hashtags lindas subindo no twitter: #humilhaçãonãoéentretenimento, #abusopsicologico, #expulsaokarolconka e por aí vai. Bonito demais.
O único problema disso tudo é o seguinte: esse buraco aí, meu povo, é muito mais embaixo. Me contem uma coisa: quantas vezes vocês já assistiram uma pessoa se humilhar e ser humilhada para ganhar algo? Dá ibope demais, né?
Luciano Hulk vai decorar a sua casa, ou tunar o seu carro. Em troca, cê vai se prestar a um papel ridículo durante o programa dele. Ah! Quer participar do Master Chef? Beleza. O maior desafio nem vai ser cozinhar, mas sim suportar 3 chefs te humilhando em rede nacional. Tá com um problema no seu casamento? Sem problemas, chama a Regina Volpato.
A humilhação, meu povo, SEMPRE FOI ENTRETENIMENTO. Ter uma pessoa se dispondo a ser humilhada, exposta e julgada por milhões de pessoas é o princípio básico de um reality show.
O BBB é um experimento social incrível e perturbador. Coloque um grupo de desconhecidos dentro de uma casa com câmera até no taco do chão da sala, não deixe que eles saiam e provoque uma série de “gatilhos” para que os participantes queiram sair no tapa. Em troca, eles concorrem a um milhão e meio.
“Ah, mas agora é diferente”. O que a Karol Conká está fazendo com o Lucas é desumano”.
Concordo demais. A linha entre humilhação e tortura psicológica é muito tênue, né? Afinal, todo mundo que se submete a um reality show está ciente que, em algum momento, será testado até o seu limite.
É quarto branco, é “xepa”, é prova de resistência, é isolamento, é jogo da discórdia e por aí vai. Tudo isso, na minha opinião, confere como tortura psicológica, porém, disfarçada de entretenimento.
A gente gosta de ver barraco, choro, dedo no cu e gritaria. Gente… pelo menos é por isso que EU, Luísa, assisto reality shows. E é por isso, meus amores, que eu sinto TANTA VERGONHA ALHEIA de mim mesma. Isso é real oficial.
Porém, existe um limite.
O único motivo pelo qual eu não boicoto esse tipo de programa é porque, na minha concepção, a pessoa que decidiu participar dele já sabe disso tudo. É por isso, inclusive, que Fiuk, Manu Gavassi e Karol Conká, assim como vários outros personagens icônicos do BBB, sempre falam assim que pisam naquele gramado: “O que é que eu vim fazer aqui, gente? Tô lascado”.
Porém, o outro lado disso tudo vem agora: é uma baita oportunidade não só de ganhar uma bolada em nome do entretenimento, mas de ganhar visibilidade aqui fora.
Foi assim com Babu e Thelma (BBB20), com Grazi Massafera e Jean Wyllys (BBB 5), Sabrina Sato (BBB 3), Gleici Damasceno e Ana Clara (BBB 18) e por aí vai. E olha que eu só estou falando de BBB. Se eu pegar todo mundo que conseguiu subir na vida depois da participação de um reality, ficaríamos aqui até amanhã.
ATENÇÃO: preciso falar um negócio importante! Mesmo com todos esses pontos positivos, não deixo de pensar que programas como esse são realmente problemáticos em mil pontos possíveis.
O problema é quando a humilhação extrapola essa linha do “eu avisei”.
Karol Conká, desde a última sexta, mirou em Lucas com toda vontade do mundo para desestabilizá-lo. Isso é jogo baixo. Ela não quer que ele coma na mesma mesa, que ele fale alguma coisa, que ele OLHE para ela e, claro, que todos da casa sigam a mesma conduta com o rapaz.
Daqui a pouco, nem no próprio pedestal ela vai caber. A rapper QUER deixar o menino doido (nas palavras dela). QUER que ele sofra TANTO a ponto de PEDIR PARA SAIR. Ela está sendo INTOLERANTE e DESNECESSÁRIA. Ela está sendo uma CANCELADORA.
As atitudes da rapper, cá para nós, passaram do nível de afronta e entraram no território do abuso, da MALDADE. Isso, minhas caras, é CRIME.
Como telespectadora, digo por mim e por milhares de outras pessoas que NINGUÉM quer ver isso. A justiça, com relação a tudo que o Lucas fez, pode ser feita de outras formas. Uma discussão aqui, um paredão ali, uma eliminação acolá. Eu queria ver alguém batendo de frente com ele, e não deixando-o à beira de uma depressão.
O BBB21 é um exemplo de como a cultura do cancelamento, dentro e fora de um programa, pode torná-lo tão pesado a ponto de ser gatilho emocional para MUITA GENTE.
Repito: NINGUÉM QUER VER ISSO.
A melhor forma de lidar com todo esse fuzuê, então, é fazer o seu papel de forma SAUDÁVEL. Ao invés de fazer um esquema “olho por olho” com a Karol, lotando as redes oficiais dela com puro chorume, resgate o seu direito enquanto telespectador de outras formas. Acione o BBB, peça pela expulsão, pare de ver o programa até que isso se resolva, converse e conscientize as pessoas sobre abuso emocional, e por aí vai.
Não seja uma Karol, boba. Seja uma pessoa que respeita o outro em sua individualidade sem achar que, por fazer isso, você é melhor que o outro (a ponto, inclusive, de querer fazer com que a pessoa atinja o fundo do poço).
A internet é tão maravilhosa, bicho. Bora fazer dela um lugar menos tóxico, peloamor.