Minimalismo: uma tendência pós-Covid-19
Estamos há cerca de um mês em quarentena. Fomos obrigadas a nos isolar, a desacelerar, a nos acostumar com outra rotina, a conviver com sentimentos que o isolamento nos desperta, e a lidar com uma situação que ninguém nunca viveu antes.
Eu, como consultora de estilo e profissional que trabalha com moda e pessoas, estou tentando entender como a moda vai responder a esse momento de crise quando pudermos sair às ruas de novo. Divido agora com vocês minhas impressões e o minimalismo como tendência.
Minimalismo: menos é mais!

Daqui pra frente, esbanjar não será um comportamento mais aceitável. Arrisco dizer que o minimalismo ganhará força. Ele preza por linhas retas, dá ênfase em cortes simples, mas de caimento perfeito, trabalha por maior praticidade e com materiais tecnológicos, sustentáveis e resistentes.
O conforto é importante até porque não sabemos até quando teremos restrições para diminuir o contato social. Trabalhar de casa pode ser necessário por mais tempo. Alguns apontam até 2022. Durabilidade é fator preponderante do movimento assim como peças atemporais.
Não acho que o minimalismo será só uma tendência de moda, mas também um estilo de vida que se acentuará ainda mais. Digo acentuar porque esse comportamento que defende que menos é mais, que valoriza as coisas simples e essenciais da vida e prega o baixo consumo já vinha em uma crescente há, pelo menos, cinco anos.
O bem-sucedido documentário lançado, em 2016, pela Netflix, ‘Minimalism: A Documentary About the Important Things’, é um dos exemplos dessa época (falamos um pouco sobre o tema aqui).
Será que moda é essencial?
Moda sempre foi importante. Quem afirma o oposto não conhece sua história e seus entrelaçamentos com a do homem. O escritor Fausto Viana afirma que antes mesmo da necessidade das vestimentas, houve a paixão pelos enfeites. E eles eram, no começo dos tempos, usados como sinal de potência masculina.
Nós não vamos parar de consumir moda, vestuário e itens de beleza. Vamos diminuir o quanto gastamos com esses itens. Isto já esta sendo constatado pelo comércio. Agora, alimentos, remédios e itens de higiene pessoal são as prioridades.
Mas as roupas são nossa segunda pele. O vestir diário organiza nossa rotina e aquela pequena parte do nosso mundo, a saber, o nosso guarda-roupas, que é um acervo pessoal rico de memórias afetivas e demonstrativo de quem somos. Através das nossas roupas construímos nossa identidade e fortalecemos nossa auto-estima, tudo isso importante pra nossa vida.
Quem conhece história sabe como os batons vermelhos na 2ª Guerra Mundial continuaram a serem produzidos por serem importante para a moral e confiança das inglesas, enquanto todos os cosméticos foram racionados. Foi também no pós-1ª Guerra que Chanel simplificou o vestuário feminino liberando-nos do uso obrigatório do espartilho, trazendo a calça pro guarda-roupa feminino e encurtando saias e cabelos.
Não é mais sobre roupas, mas sobre pessoas
Mais do que nunca as roupas que forem criadas agora têm que atender as demandas de vestir das pessoas. E pensar assim desloca o eixo da criação puramente narcisista do estilista para uma criação mais empática. Moda reflete as mudanças da sociedade e agora as pessoas estão recolhidas, mais introspectivas e observadoras, ganhando peso com o isolamento, procurando nas roupas por abrigo, conforto, aconchego e proteção e não, o olhar do outro.
Talvez, caiba falar até em tendência anti-tendência, em coleções mais enxutas e menos frequentes. As marcas de slow fashion já não fazem coleções para as quatro estações. Talvez esse modo de produzir se alargue ainda mais.
Armário-cápsula
No embalo do minimalismo, muitos outros movimentos e iniciativas afins como comércio justo, compre do pequeno, comércio local, vieram juntas. O armário-cápsula foi uma delas. A ideia é se livrar dos excessos, do que você não usa e que te dá a sensação de ‘armário lotado sem nada pra vestir’.
É ter um guarda-roupa enxuto, com peças que você ama, façam o seu estilo, sejam versáteis e que você realmente usa. Porque é muito comum as mulheres terem um armário enorme e subaproveitado com cerca de 1/3 das peças sendo usadas. Desperdiçar, se já não estava em baixa, estará ainda mais. A ordem agora é reaproveitar.
Consultoria de estilo: multiplicação dos looks sem precisar comprar nada
Não conheço serviço melhor e mais adequado para esse momento do que a consultoria de estilo. Ela ensina e treina você, dentre outras coisas, a reaproveitar e dar um novo olhar ao que você já tem no seu armário.
Versatilizar peças, apresentar novas combinações pra cliente, ver os looks se multiplicarem: tudo isso faz parte desse trabalho lindo. Uma pequena mostra é o fato de que cada peça do seu armário deve fazer looks que você tenha vontade de usar com pelo menos outras três. Isso faz o seu guarda-roupa render.
Daqui pra frente, não tem mais como comprar roupa pra uma ocasião só como roupa de festa, roupa de ficar em casa. Roupa deve ter muitas funções e a consultoria de estilo te ensina, por exemplo, a levar o maiô da praia/piscina para a boate, a legging da academia para a festa, a camisola para o encontro com o boy, a calça de moletom pra sair com as amigas.
Em momentos de crise, a gente não precisa e nem deve comprar nada novo. Já temos o suficiente. Por isso, o minimalismo veio pra ficar.
China pós-Covid-19
No primeiro dia pós-isolamento social, na China, a loja de luxo Hèrmes faturou mais de R$ 14 milhões de reais em um dia. Isto aconteceu em uma das províncias mais ricas da China e especialistas dizem que o que pode ter motivado esse comportamento foi a venda de peças raras.
Acho que há euforia nessa pós-quarentena em uma resposta chamada de ‘Revenge Buying’. Pode acontecer por aqui também, mas será que o comportamento que prima por excessos vai durar por muito tempo? E também temos que considerar que a China é um país muito mais rico que o Brasil.
Fazer previsões sobre a moda pós-Covid-19 e quais (novas?) necessidades de vestuário precisaremos atender ainda é um caminho incerto. No entanto, temos sempre a história para nos atender. Sustentabilidade, solidariedade e compartilhamento são palavras que estarão no horizonte. A ver.
Imagem: Unsplash