Perfeccionismo e a síndrome do impostor: você é sua própria opressora
O livro estava escrito há anos. Comecei a pensar em publicação em 2009 — tinha 22 anos. Porque então somente o publiquei aos 33, em 2020 (no meio da pandemia)? A resposta é simples — Perfeccionismo.
Eu não me cansava de reescrever o livro, de mudar cada diálogo, escolher cada palavra. Era uma luta diária com o dicionário para soar o melhor possível e nunca estava bom. Demorei muito — até demais — para deixar alguém ler meu trabalho. Era um medo tão grande de ser mal interpretada, de ser julgada, queimada em praça pública.
Muito desse medo reflete a época em que vivemos. A intolerância triplicou com a acessibilidade da internet. Todos têm uma opinião, e se sua opinião é diferente da minha, então nós não podemos conversar, não podemos ter um diálogo.
E de alguma maneira, um dos temas do meu romance é isso mesmo — o que falar, quando falar, e por que falar. Essas são as três perguntas que deveriam sempre nos acompanhar.
Mas mais do que tudo, eu encarava a minha “mania de perfeição” como algo bom. Pensava que estava, na verdade, sendo minuciosa, criteriosa. Na verdade, estava morrendo de medo.
Mas o que afinal é o perfeccionismo?
O dicionário define perfeccionismo com uma obsessão. Nesse caso, temos uma obsessão em executar tudo com perfeição, com excelência, com o menor número de erro possível. E como seres humanos, fadados ao erro, o perfeito é sempre algo intangível.
Existe, nas nossas cabeças, ideias pré-estabelecidas do que é bom, do que é bonito, do que vale a pena. Essas ideias, esses pré-conceitos, movem nossas escolhas pessoais e tudo que fazemos na vida. Se não trabalhamos essas ideias preconceituosas, é claro, nos tornamos seres incapazes de viver na sociedade de forma pacífica e tolerante, pois não aceitamos quando os outros saem dos nossos parâmetros.
Além de irreais, esses parâmetros são controlados pelos sistemas opressores da sociedade — que está longe de ser neutra. São esses sistemas opressores que ditam a maneira “perfeita” de ser, de se comportar, de viver na sociedade. Qualquer curvatura, qualquer um que não se alinhe, precisa ser “expulso” da república, como o poeta de Sócrates.
Mulheres e o perfeccionismo
Na academia, mulheres pesquisadoras sofrem muito mais da síndrome de impostora do que os homens. As mulheres, afinal, têm mais “medo” de publicar suas pesquisas, ou se sentem incapazes e uma fraude quando se comparam com outras. Não somente isso é um reflexo do mundo patriarcal opressor, mas também da falta de representatividade em diversos setores.
Isso é ainda pior em mulheres negras e indígenas, que além da opressão de gênero, também sofrem outra camada de opressão pela cor da pele, e — muitas vezes — pelo nível social também. A síndrome do impostor nada mais é do que o perfeccionismo disfarçado de medo pela falta de reconhecimento na sociedade.
Nós também somos nossos opressores
Todas as vezes que dizemos para nós meses “Isso não está bom o suficiente” ou “Você precisa melhorar muito isso antes de publicar” estamos sendo nossos próprios opressores. Deixamos a sociedade — com seus pré-conceitos e opressões — ditar como devemos nos enxergar perante o mundo. Nada é mais cruel do que acreditar que você não é capaz.
Lidar com o perfeccionismo é lidar com uma crítica interna que somente leva em conta o que te rodeia, e não o que você sabe sobre você mesma. Se você deu o seu melhor, por que temer? Estamos em um mundo em movimento, que aprende ou não com os erros do passado. Então por que se martirizar, pensando que nada do que você faz é bom o suficiente?
2020 está chegando ao fim, e nessa energia de renovação que a volta da Terra em torno do Sol nos garante, renove também suas ideias e pré-conceitos sobre o que te faz ir além. Comece os projetos sem medo de errar — porque são nos erros que nós aprendemos a fazer melhor da próxima vez. Nada nunca vai ser perfeito, mas pode sim ser o melhor que poderia ser naquele momento.
Chega de perfeccionismo! Vamos iniciar essa década com um novo substantivo. Que tal um Empoderamentismo?
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